domingo, 20 de fevereiro de 2011



O texto seleccionado para o concurso de escrita "Quem conta um conto, acrescenta um ponto" e que representará o Agrupamento de Escolas a nível nacional é o texto da aluna Ana João Dias de Almeida do 6ºD.

Parabéns à vencedora e aos restantes participantes.

Aproveitem e leiam o texto lindíssimo e criativo da concorrente...




Cabrália, 28 de Fevereiro de 1502


A/C
EL Rei Dº Manuel I
Palácio de Belém
1050-100 Lisboa

Volto humildemente a escrever a Vª Alteza, em primeiro lugar para lhe manifestar o meu mais profundo reconhecimento pela graça que me concedeu no Outono passado, em trazer para o pé deste seu humilde e fiel servidor, o seu genro Jorge Osório e minha amada filha Gertrudes Viana do Castelo e de Caminha.
Creia Vossa Alteza que a presença destes meus entes queridos iluminou os meus já idos anos, até ao dia em que sobre mim se abateu enorme negrura, só confundível com a cor de alguns nativos. Na verdade, quando recebi o meu nobre genro, logo o nomeei capitão da minha donataria, que baptizei de “Ipanema Osório”, com a incumbência de a povoar, desenvolver economicamente e espalhar a fé cristã.
No início, tudo parecia correr bem! Arrecadou sessenta e oito nativos, dez homens e cinquenta e oito mulheres, e ainda dezasseis desterrados da metrópole. Todos receberam a sua parcela de terra e juraram-lhe fidelidade. Até um belo dia em que o meu fiel escudeiro, o nativo “Seunacibi”, me revelou um segredo: José Osório, o meu genro, até então sempre fiel, tinha-se apaixonado pela índia “Jurassi”! Uma nativa morena, de olhos azuis e que, ao contrário dos outros que se aculturaram vestindo-se, continuava a andar nua pela fazenda! Perante esta traição feita à minha amada filha e sobretudo a mim, que tanto empenhei a minha palavra e carácter para o trazer de S. Tomé, decidi convocá-lo para ser ouvido no Tribunal de “Arara de Baixo”, situado na capital da Terra de Vera Cruz, de que Vossa Alteza me deu a graça de ser o governador-geral.
Trazido diante dos meus olhos, acorrentado nas mãos, perguntei-lhe sobre a verdade do boato que corria na sua capitania, segundo o qual, às escondidas, se enrolava na palha dos campos com a imunda “Jurassi”, desrespeitando a honra de minha amada filha!
Armado numa coragem, digna dos cobardes…, o mesmo respondeu: “A paixão não escolhe momento, nem dia, nem hora, nem dama, nem escrava! Simplesmente acontece. Jamais procurei desonrar a família de meu ilustre sogro. Porém, o coração tem razões que a razão desconhece”.
Desolado com tamanha afronta à dignidade dos Caminhas, decidi terminar de imediato o interrogatório e proferir sentença de morte, sem apelo nem agravo, ordenando que a execução acontecesse na Praça do Pelourinho, com recurso ao calor do fogo!
Fogo… O fogo consumiu as suas entranhas, traiu-o como ele havia traído a minha adorada família. Triste castigo o dele, amarga vingança a minha… Até então, tudo o que me aprazia fazer era dar-lhe a provar um pouco do seu veneno. Mas agora, lembrando-me daquela imagem compassiva, penso que tudo isto terá sido em vão.
Despeço-me de Vossa Alteza com o coração despedaçado e a pena trémula, rogando-lhe para que me autorize a regressar à minha amada âncora-praia, onde passarei em paz os meus últimos dias, não sem que antes entregue as Vossas Terras deste lado do Atlântico ao meu fiel e bom Cristão “Índio Pele Vermelha”!

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